2.8.04

Seis números

Olhava resignado para o volante que segurava. No estômago sentia o revirar dolorido da apreensão. No bolso o peso do Taurus modelo 82S. Gastara seus últimos reais, emprestados, no revólver. Calibre .38 especial, cano de 76 mm, acabamento em aço inox. Seis tiros. Seis números. Estava decidido: sua vida agora estava nas mãos da Caixa Econômica Federal. Ia pro tudo ou nada. Apostara todas as fichas. Ou acertava aqueles malditos números ou dava cabo daquela vida miserável. Vida que passara num flash ao marcar o cartão esverdeado. 07 e 10. Dia e mês do seu nascimento. Ou quando sua desgraça começara, como costumava dizer. 22. A idade que tinha quando deu seu primeiro beijo. "Agora passa pra cá meu dinheiro", escutou logo depois. 30. A idade que se casara com Marlene. 42. O tamanho dos sapatos que encontrara escondidos no armário e que não eram seus. 43. A idade em que finalmente teria paz. Ou a dos milhões ou a do descanso eterno. O sorteio era em Esteio, terra para onde se mudara, certa vez, para encontrar uma desejada namorada por correspondência e encontrara um rapaz franzino lhe esperando. Mais um sinal de que, daquele lugar, sairia a solução que poria logo fim a todos os percalços, as humilhações, os azares, as tristezas, os desencontros e os desenganos que acumulara durante todos aqueles anos. E, sorteados os números, o prêmio também acumulou.

14.01.04

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